terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Análise de, O Muro - de Jean Paul Sartre


Marcelo Alves


Ano passado, eu havia lido A peste, de Camus e, assim me introduzira no existencialismo. Agora, retomei o entendimento dessa corrente filosófica lendo a coletânea de contos: O Muro. Os contos propõem-se a ilustrar a teoria filosófica de Sartre e criam atmosferas tensas de extremo limite.
Assim, o conto O Muro demonstra detalhadamente as últimas horas de 3 condenados. No termo de suas vidas, os homens perguntam-se do significado de tudo o que fizeram, de qual era a valia da subversão de suas vidas. O personagem principal percebe-se inumano e indiferente a tudo, ignora seu passado e sua mulher e perde os sentimentos. Mas quando lhe pedem para entregar o seu líder, ele nega-se e reconhece depois não haver nenhum sentido para aquela negativa, salvo a obstinação.

O Quarto, ensaia, de certo modo sobre a força do amor. Dois casais são equiparados: o primeiro, apesar de morar sob mesmo teto, não suporta quaisquer conversas, exceto sobre a vida de sua filha. O segundo é formado por um louco que já nem sabe mais o nome de sua esposa. Neste, o amor incondicional de Eve a leva a amar o seu esposo pelo que ele fora, mas mesmo quando ele se tornou ensandecido, ela continuou a amá-lo e esforçava-se, em vão, para compreender as loucuras de Pierre, para ficar mais próxima a ele, transpor a única barreira que os separava. Ao final, Eve afirma que mataria Pierre se ele ficasse perdido e deformado em sua loucura, quando ela atingisse o ápice; privando-o dos vexames que ele sofreria inconscientemente.

Erostrato trata da ambição desmedida pela fama e pelo reconhecimento. O personagem principal, um ser totalmente banal, reserva-se a liberdade de odiar os homens e sua iniquidade.

Então, ele planeja durante meses sair às ruas e atirar em todos que aparecerem a sua frente e depois se matar. No dia, ele manda cartas a 102 escritores franceses explicando seus motivos e pedindo a eles para abrirem os jornais e contemplarem seu feito. Ele atira em um homem e corre da multidão, esconde-se no banheiro, mas não tem coragem de tirar a própria vida, a escolha de apertar o gatilho é pesada demais a ele e ele sucumbe à sua fraqueza.

Intimidade mostra a dificuldade dos homens em mudar radicalmente sua vida. Luci é uma mulher subjugada e maltratada por seu homem, sente-se infeliz e, após apanhar de seu marido, chega a planejar sua fuga com outro homem. Tudo isso influenciada por uma amiga, que julga conhecê-la e ter total domínio sobre Luci. Porém, na última hora, ela inventa vários motivos e dissuadia sua mente a abandonar a ideia e volta para casa.

O último conto, A Infância de um Chefe, é o que mais marcado pelo existencialismo. Sartre afirma que "A existência precede e governa a essência." Então, no conto, o personagem principal vive perguntando por que existe, qual é o significado de sua vida. E após tentar encontrar em Freud e Rimbaud um motivo de viver, ele entende o preceito principal do existencialismo: um ser existe, inicialmente, desapegado de qualquer essência e vai constituindo, livremente, seus pensamentos e conceitos durante as experiências de sua vida; em suas palavras: “é a vida; não se pode julgar nem compreender, é preciso deixar a coisa correr.” Ele termina como a figurinha ridícula e prepotente, assim como seu pai.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Análise de O Som e a Fúria; de William Faulkner


Marcelo Alves

"É curioso que, seja do que for que uma pessoa se queixe, os homens nos digam todos para irmos ao dentista e as mulheres para nos casarmos. E é sempre alguém que nunca fez grande coisa na vida que nos vem dizer como havemos de governar a nossa. É como esses professores da universidade, que nem um par de peúgas têm de seu, a ensinarem-nos como ganhar um milhão em dez anos, e uma mulher que nem marido conseguiu arranjar a dar-nos conselhos sobre como criar uma família."

O Som e a Fúria é um livro extremamente denso e carrega em suas páginas um forte tom de loucura, que, de certo modo, envolve o leitor tão fortemente, que a seqüência racional do entendimento é destruída e cede lugar à percepção sensorial das sensações dos personagens.


Explico-me, o livro é composto de 4 visões diferentes, com pouca noção de linearidade temporal e racional. Assim, o primeiro capitulo é narrado através das sensações de um autista, o que apresenta ao leitor algo totalmente novo, pois não há lógica no encadeamento de idéias, os eventos são separados, retomados, misturados e confundidos aleatoriamente. Algo de extraordinário!

O segundo capítulo é narrado em uma época meio que perdida dentro da história e é a parte mais complexa do livro. Quentin, um suicida absolutamente sombrio e pessimista discorre sobre seus estudos em Harvard, porém sua escrita não segue nenhuma regra gramatical e fica enleada a pensamentos, a acontecimentos passados e a devaneios. O leitor fica totalmente perdido e para entender o nexo da história, dispõe de pequenos fragmentos de conversas inacreditáveis, pela insanidade e complexidade.

Os dois últimos capítulos elucidam os acontecimentos, mais de um modo lacônico e superficial, portanto o leitor fica entregue às suas próprias teorias. A estória conta a decadência de uma família desunida e fadada à desgraça. A mãe odeia seus três primeiros filhos: Ben, um louco; Quentin, o suicida, que pensa em matar a irmã, Caddy, e matar-se, para que no inferno ele proteja a virgindade e a honra da sua irmã; e Caddy, que se casa inúmeras vezes, deixa uma filha para a família cuidar e some no mundo. Jason é o único dos filhos que Caroline diz amar. Ele trabalha incessantemente, para cuidar da filha de Caddy, a Quentin (homenagem ao irmão morto), e de sua família arruinada. Acaba mostrando-se racista, autoritário e desvia todo o dinheiro que Caddy envia para a Quentin.

No aspecto geral, o Som e a Fúria é um romance deslumbrante e difícil de ser lido. Faulkner abandona seus leitores, no que concerne ao desenvolvimento e razões da estória; o que causa um fascinante efeito de interpretação dos motivos da decadência da família e dos tristes fatos que se desenrolam na trama. No meu ponto de vista, é um livro fatalista, visto que os integrantes da claudicante família correm sem perceber para um abismo do qual não há escapatória, pois eles se negam a olhar para o futuro, brigam entre si, destilando um verdadeiro ódio uns contra os outros. Há partes em que Caroline amaldiçoa seus malsinados filhos e não chora suas mortes.

Sensacional! Esse trecho ilustra o pessimismo e fatalismo irremediáveis do livro:
“Nenhuma batalha sequer é lutada. O campo revela ao homem sua loucura e desespero, e a vitoria é uma ilusão de filósofos e néscios.”

sábado, 14 de fevereiro de 2009

O jogador; de Fiódor Dostoievski


Marcelo Alves

“Neste momento senti que eu era um jogador. Senti isso como nunca até então. Minhas mãos tremiam, as pernas vergavam-se. As têmporas pulsavam agitadamente…”


Pensativo e maravilhado, terminei a leitura desse excepcional romance do mestre russo e resolvi fazer uma analise da psicologia do personagem principal, conjeturar da causa que o tenha levado ao vício.

Nesse livro, Dostoievski propõe-se a tratar sobre a compulsão de jogo e o poder de destruição que pode exercer sobre o homem. Em Roulettenbourg (nome irônico), cidadezinha russa, Alexei Ivanovich é um homem sem nenhuma aspiração, mas com um agudo senso de percepção da realidade e do mundo em sua volta. Ele apaixona-se por Paulina, mulher jovem que não dá atenção a ele e se compraz em humilhá-lo, mas afirma não viver sem ele.
Quando Paulina vê-se falida, ela pede a Alexei que aposte seu ultimo dinheiro na roleta e a partir daí passa a amar Alexei, que ainda era um homem escrupuloso e sentimental. Em certo ponto,
Alexei jura jogar-se de uma ponte se Paulina assim desejasse. Entretanto, o meio sujo, vazio de sentimento e sentido em que Alexei se encontra faz com que ele perca o interesse pelos homens, na sua maioria interessados por dinheiro, e passe a odiar aquela corja de golpistas que torcia pela morte de uma idosa para herdar-lhe a fortuna.
Inicialmente, Alexei afirma que o dinheiro deve ser suficiente para viver, mas acumular quantias suntuosas, mesmo que a muito trabalho e parcimônia, é inútil. Chega a dizer que o dinheiro é apenas uma ferramenta de poder para os homens poderosos julgarem e castigarem os que não são iguais a eles.

Sempre que Alexei vai ao cassino, ele percebe um lugar moralmente sujo e abjeto, no qual o homem entrega-se à ganância à falta de escrúpulos. Inicialmente, ele perde o último dinheiro de Paulina e depois, vê a Babuschka perder toda a sua fortuna e retornar desolada aos recônditos de Moscou. No entanto, quando Paulina declara o seu amor a ele, Alexei a deixa no quarto e aposta todas as suas economia na roleta, entre as apostas, ele ganha uma quantia exorbitante e aposta absolutamente absorto e compulsivamente, sem ver quantias, apenas resultados. Sai do cassino com uma quantia vultosa nos bolsos e corre para mostrá-la a Paulina, que ficara no quarto.

Dessa forma, ele oferece o dinheiro que ela precisava para pagar suas dívidas e ela, sentido-se mais uma vez comprada, enlouquece. Mesmo declarando amor incondicional a ela, Paulina resolve amparar-se em Mr. Astley; e Alexei vai para Paris com o intuito de torrar a sua fortuna com duas mulheres, em um mês.
Assim ele passa a vagar pelas ruas em condição sub-humana e chega a ser lacaio, gastando todo o dinheiro que tinha na roleta. Segundo ele, não era pelo dinheiro que poderia ganhar, mas pela glória de ouvir seu nome, ser felicitado, ser lembrado e paparicado. No ápice da insanidade, ele busca o dinheiro na roleta como um louco, tentando ganhar fortuna e obter o reconhecimento de Paulina, mostrar que era digno de seu amor.

Refém de uma sociedade corrupta, em que os valores foram abandonados e, na qual seres vazios de significado e moral vivem apenas para conquistar e dominar, ele vê um refúgio na jogatina, sua única possibilidade de atingir a glória, mesmo que para isso tenha que apostar o amor, o seu futuro, as suas amizades e oportunidades. Termina como indigente, que com um pouco de dinheiro dado por Mr. Astley, para encontrar Paulina que ainda o ama, conjetura se deve empenhá-lo no jogo ou tomar um trem para reencontrá-la.Sendo que o próprio Astley afirma que não dará mais dinheiro por ter a certeza de que o apostará; Alexei já está completamente perdido e dominado pelo vício.

Acaba dizendo que está cônscio de sua situação abominável, pior que a de um mendigo, ruína total!
Por fim, O Jogador é um romance que mescla os valores, a psicologia e o amor. Amiúde esquecido e humilhado, Alexei perde sua sanidade na roleta e não percebe que Paulina desejava apenas o seu amor...